Além dos efeitos do ataque hacker, usuários do ConecteSUS sofrem com erros nos cadastros

Segundo Ministério da Saúde, mais de 50 mil pedidos de correção de informações pessoais foram feitos entre agosto e outubro. Responsabilidade é de operadores, diz a pasta.

Além da falta de acesso aos comprovantes de vacinação devido ao ataque hacker à plataforma na madrugada desta sexta-feira (10), uma parcela dos usuários do aplicativo ConecteSUS enfrenta problemas com falhas nos registros dos dados pessoais no aplicativo.

Entre agosto e outubro deste ano, o Ministério da Saúde recebeu 50.064 pedidos de correção de dados registrados no ConecteSUS, segundo informações da própria pasta obtidas pelo g1 por meio da Lei de Acesso à Informação. Até esta sexta, o aplicativo reunia cerca de 190 milhões de usuários — todos os cadastrados no Sistema Único de Saúde (SUS).

Entre esses usuários, há nomes grafados incorretamente; erros nos nomes dos pais; informação trocada no campo “gênero”; erros no nome e no número de doses da vacina; casos de pessoas vivas apontadas como mortas; e brasileiros natos com outra nacionalidade.

As falhas no registro dos dados pessoais no ConecteSUS afetam a emissão correta do Certificado Nacional de Vacinação contra a Covid-19 desses usuários e podem impedir a aplicação de doses adicionais da vacina contra a Covid e o acesso a medicamentos e tratamento no SUS. Além disso, em várias partes do país, estados e municípios passaram a exigir comprovação de imunização completa contra a Covid para acesso a serviços públicos e uma série de atividades presenciais.

Segundo especialistas, antes mesmo do ataque hacker, as falhas nos registros já indicavam vulnerabilidade dos sistemas do SUS.

O Ministério da Saúde afirma que a responsabilidade pelo acesso e pelas alterações nos dados de usuários é de “agentes públicos legalmente autorizados”.

Em resposta ao questionamento do g1, o ministério informou que há 260 mil operadores habilitados — responsáveis pela manipulação dos dados — vinculados às secretarias de saúde estaduais, municipais e do Distrito Federal. Segundo a pasta, esses órgãos “têm competência para tomar as medidas cabíveis junto aos operadores”.

De acordo com o ministério, não é possível informar a quantidade de casos em que as falhas de preenchimento em cadastros de usuários foram corrigidas.

Alterações indevidas

Antes mesmo do ataque hacker ao ministério, especialistas alertavam que brechas nos sistemas da pasta possibilitariam, além do sequestro de dados, alterações sem critérios em informações pessoais.

Em parte dos casos, o cadastro foi deliberadamente adulterado, conforme informou o próprio ministério. Segundo a pasta, essas adulterações foram cometidas por operadores que, após apuração interna, tiveram os acessos ao sistema bloqueados.

Um desses casos é o da presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR). Em junho deste ano, ao se apresentar para tomar a primeira dose da vacina contra a Covid, a enfermeira do posto de saúde informou, segundo a deputada, que ela estava registrada como “morta” no prontuário. No campo reservado ao nome, disse, estava escrito “Bolsonaro”. De acordo com a parlamentar, os dados pessoais já foram corrigidos.

O líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), ex-candidato à Prefeitura de São Paulo Guilherme Boulos (PSOL), e a ex-deputada e ex-candidata à Prefeitura de Porto Alegre Manuela D’Ávila (PCdoB) também se disseram alvos de adulteração nos registros do SUS.

“[Os dados] foram alterados por ofensas e xingamentos grosseiros”, disse Boulos. Manuela D’Ávila afirmou ter sido declarada morta. O registro havia sido corrigido, mas, na última quinta (9), a ex-deputada voltou a dizer, em redes sociais, que a carteira de vacinação foi novamente alterada.

O microbiologista Atila Iamarino e os youtubers Felipe Neto, Felipe Castanhari e Nyvi Estephan também identificaram inconsistências nos cadastros pessoais do SUS.

Iamarino disse ter sido classificado por um operador com credencial de médico em Porto Velho como “morto” e que no cadastro dele havia frases com apologia nazista e ofensas. Segundo informou, o cadastro foi corrigido no último dia 2. De acordo com o ministério, o operador teve o acesso ao sistema bloqueado, mas a pasta não esclareceu se ele sofreu alguma sanção.

O que prevê a lei

Segundo a portaria que estabeleceu o ConecteSUS, o acesso aos dados está sujeito à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), que tem como alguns de seus fundamentos o respeito à privacidade, a autodeterminação informativa e a inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem.

No aplicativo, os usuários podem consultar uma nota informativa que reforça o critério sigiloso e inviolável dos dados: “Os acessos não autorizados e usos indevidos por usuários da RNDS [Rede Nacional de Dados em Saúde] estão sujeitos a penalidades previstas na legislação”.

Desde agosto, o uso e a manipulação indevida de dados podem ser punidos com base na LGPD. A aplicação das sanções, que podem chegar a R$ 50 milhões, cabe à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

Órgãos públicos, de acordo com a agência, podem sofrer “advertência, publicização da infração, bloqueio ou eliminação dos dados, suspensão parcial, total ou proibição total do funcionamento do banco ou da atividade de tratamento”.

Fonte: G1

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