Polícia Civil descobre clínica de aborto em Novo Hamburgo e prende três pessoas

Local, que fica em um prédio residencial, passou a ser monitorado após denúncia anônima. Investigação está na primeira etapa e é sigilosa.

Após dois meses de investigações, a Polícia Civil comprovou a existência de uma clínica clandestina de aborto na cidade de Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, e prendeu três pessoas em flagrante em operação realizada na última sexta-feira (13). As informações foram divulgadas em entrevista nesta segunda (16).

Quando os policiais chegaram ao local, que fica em um prédio residencial, havia uma mulher, que foi ouvida e liberada por falta de prova material de que havia passado pelo procedimento, segundo a polícia.

Os presos seriam os responsáveis pelo funcionamento da clínica. Um deles é técnico em enfermagem. Os flagrantes foram por crime de aborto, comércio ilegal de medicamentos e porte ilegal de arma, encontrada na casa de um deles e em situação de roubo, conforme a polícia. Também foi apreendida uma quantia em dinheiro.

Imagem da maca encontrada no apartamento onde funcionava a clínica de aborto — Foto: Polícia Civil/Divulgação

Imagem da maca encontrada no apartamento onde funcionava a clínica de aborto — Foto: Polícia Civil/Divulgação

“Observamos uma grande quantidade de medicamentos. Inúmeras cartelas de outro medicamento, não o que era dito pelas pessoas na marcação do procedimento. Usavam medicamento vendido no mercado negro. Tudo foi aprendido para análise”, destaca a delegada Roberta Bertoldo.

“O local não dispunha de qualquer tipo de higienização. Mulheres deitavam numa maca sem qualquer tipo de cuidado. Todo o procedimento era feito dentro de um quarto, com equipamentos extremamente rudimentares.”

Cartelas de medicamentos foram apreendidas na clínica clandestina — Foto: Polícia Civil/Divulgação

Cartelas de medicamentos foram apreendidas na clínica clandestina — Foto: Polícia Civil/Divulgação

A investigação se iniciou após denúncia anônima. De acordo com a polícia, uma mulher foi até a 2ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa, em Porto Alegre, depois de ter visto publicações em redes sociais. Havia um número de contato em uma página, com DDD 51.

No decorrer da investigação os policiais confirmaram que o local ficava em Novo Hamburgo, mas seguiram no caso.

Durante cerca de 30 dias, os investigadores monitoraram o prédio e identificaram a entrada e saúde de “inúmeras mulheres”. A segunda etapa da apuração policial irá focar nessas clientes.

“Essa investigação vem monitorando uma série de pessoas que supostamente teriam se submetido ao procedimento. Até o momento, a investigação focou nos responsáveis pela realização. A partir de agora vamos investigar essas mulheres e verificar se realmente efetuaram aborto, se estavam grávidas, e isso está em sigilo. Não vamos passar informações sobre nenhuma dessas mulheres”, pontua a delegada Vanessa Pitrez.

“Ainda não temos certeza se elas estavam ali para praticar aborto. Mas temos prova robusta de que as pessoas que estavam na clínica no momento [da operação] estavam praticando aborto”, acrescenta o delegado Eibert Moreira.

Apreensões realizadas pela polícia em clínica clandestina de aborto  — Foto: Polícia Civil/Divulgação

Apreensões realizadas pela polícia em clínica clandestina de aborto — Foto: Polícia Civil/Divulgação

A mulher que estava na clínica no dia da operação ainda fará parte da investigação. A polícia explica que ela não foi presa por falta de prova para o flagrante.

“Aguardamos a confirmação da perícia. Para o flagrante, precisamos ter a materialidade. Feto, resíduo placentário… O que não quer dizer que vamos colher outras provas. Porém, o crime também seria afiançável, iríamos arbitrar a fiança e ela poderia ser liberada”, explica Vanessa.

“Indagamos a ela o que foi feito e ela não soube detalhar, disse apenas que só queria que tudo aquilo terminasse. Não sabia dizer o que colocaram no seu organismo”, completa a delegada Roberta.

Imagem do banheiro do apartamento — Foto: Polícia Civil/Divulgação

Imagem do banheiro do apartamento — Foto: Polícia Civil/Divulgação

Legislação sobre o aborto

Atualmente, o aborto é previsto em três situações:

  • quando a gravidez é resultado de estupro;
  • quando há risco de vida para a mulher;
  • se o feto for anencéfalo.

Nas duas primeiras situações, a permissão do aborto é prevista em lei. No caso de feto anencéfalo, foi resultado de um entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Penas

O artigo 124 do Código Penal diz que “provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque” tem pena de detenção de um a três anos.

Sobre aborto provocado por terceiro, o artigo 125 fala que “sem consentimento da gestante” a pena é de três a dez anos de reclusão. O artigo 126 diz que “provocar aborto com o consentimento da gestante” tem pena de um a quatro anos.

Já o artigo 127 diz que “penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.”

O artigo 128 diz que “não se pune o aborto praticado por médico” se:

  • o aborto for necessário, se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
  • o aborto for no caso de gravidez resultante de estupro e for precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Fonte: G1