Quando o RS terá o pico de coronavírus? Especialistas apontam variáveis que precisam ser consideradas

Modelos e simulações tentam encontrar respostas para evitar colapso no sistema de saúde.

Maio, junho e até julho já foram apontados como os meses em que o pico de coronavírus pode ocorrer no Rio Grande do Sul. Nesta semana, o governador Eduardo Leite projetou um cenário mais crítico no final de junho, com a chegada do inverno e o aumento dos casos de síndromes respiratórias, historicamente conhecido. Contudo, especialistas não se arriscam a cravar datas para uma possível alta nos números de casos no Estado.

 —  Não ouso falar quando vai ser o pico de nada. Tem uma brincadeira que diz: este ano o meu time pode ser campeão brasileiro ou ser rebaixado  —  diz Paulo Lotufo, professor de clínica médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

Porém, Lotufo concorda que o frio tem impacto importante no sistema de saúde. Com as baixas temperaturas, observa, problemas respiratórios se agravam e também há aumento nos registros de doenças cardíacas e acidente vascular cerebral.

—  O fato existe, mas não sabemos explicar. O que acontece é que isso vai sobrecarregar os serviços de atenção médica. O frio traz isso  —  complementa.

Inácio Crochemore da Silva, epidemiologista da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), afirma que o ponto determinante para diminuir o número de casos ou retardá-lo é o distanciamento social:

 —  Não sei se o governador está trabalhando com projeções que considerem a flexibilização do distanciamento. Fato é que o pico depende muito dessas medidas. A preocupação é de um colapso no sistema de saúde. Anualmente, a demanda no inverno, em decorrência de síndromes respiratórias agudas, é grande.

Mas existe alguma possibilidade não chegarmos a um pico?

Silva avalia que o auge de casos deve chegar, o que pode variar é a sua magnitude. Se for muito baixa, pode deixar uma parte maior da população suscetível a uma segunda onda. Por outro lado, Lotufo tem esperança de que ocorra um platô, aos moldes do que ocorreu na Nova Zelândia, onde há menos de 1,5 mil casos confirmados e houve uma política dura de controle de circulação de pessoas. Mas para isso, defende, é fundamental manter as medidas de distanciamento social:

 —  Loucura é deixar ter o pico para fazer com que as pessoas tenham imunidade de massa. Se não tivesse sido tomada nenhuma medida, o que ia acontecer é um aumento explosivo no número de casos e de mortes. Pessoas morrendo nas ruas. Ia ser pavoroso. Como houve intervenção, estamos estendendo a duração com impacto em termos de vidas muito menor. Não estar acontecendo um número absurdo de casos no Rio Grande do Sul é mérito das ações que estão sendo feitas. O raciocínio é o contrário (do que está sendo feito com a flexibilização): como está dando certo, o distanciamento tem de continuar.

Modelos matemáticos também apontam impacto do distanciamento social

Membro do Grupo de Dispersão de Poluentes e Engenharia Nuclear da UFPel, a matemática Daniela Buske também engrossa o coro de que não é possível traçar datas específicas para um possível pico, e que tudo vai depender do distanciamento social nos próximos dias:

 —  Não tem como prever 100% que vai ser no fim de junho. Pode ser antes ou depois. No entanto, acredito que o governador está certo. O governo tem um modelo matemático bem robusto e, com certeza, ele não está falando algo em desacordo com as simulações.

Se não houver alterações nas variáveis, como o distanciamento social, os modelos indicam que entre o fim de junho e julho pode-se esperar crescimento nos casos, estima Daniela. O grupo da UFPel divulga, uma vez por semana, modelos matemáticos que mostram a evolução dos casos no Brasil, no Rio Grande do Sul e em Porto Alegre. Um dos modelos, atualizado em 24 de abril, mostra claramente o efeito do distanciamento social na evolução dos casos: a simulação apontou grande aumento no número  de infectados, pois não havia sido ajustado para considerar o isolamento. Isso resultou em uma projeção muito maior do que ocorreu de fato. Agora, o modelo segue ajustamento que considera o distanciamento social.

Fonte: Gaúcha/ZH