Saiba por que as pessoas gostam de ver tragédias de perto

Sempre que acontece alguma tragédia envolvendo vítimas humanas, como acidentes de trânsito, que são mais comuns e, alguns muito graves ou até mesmo com óbitos, não demora até que fotografias e vídeos, alguns macabros comecem a circular pela internet. O pior é que, por mais mórbido e errado que pareça, a verdade é que simplesmente muitos não conseguem resistir à tentação de dar uma olhadinha, nem que seja para se arrepender mais tarde. Outro ponto mais crítico ainda, são as pessoas que se aglomeram e na maioria das vezes causam um grande problema para os profissionais de segurança e saúde que precisam, de fato, realizarem um trabalho de urgência e emergência que pode ser o grande diferencial para salvar a vida de uma vítima.

A reportagem conversou com três policiais militares que discorreram sobre algumas das várias situações críticas que chegaram em um local que havia mais de uma vítima, ferida ou em óbito, e a população muitas vezes, pelo fascínio da curiosidade acaba por atrapalhar.

Tenente Nei Machado,da Brigada Militar, lembrou que já houve ocorrências, principalmente no trânsito que a curiosidade do condutor que está passando é mais forte que a atenção no trajeto que está realizando e provoca um outro acidente. Ele que já atuou na Capital e em outros locais em que a violência é muito mais evidente que em Alegrete, em casos que a polícia  estava trocando tiros com bandidos e os moradores da localidade ficam na rua para tentar identificar ou filmar. Isso coloca a vida de todos em risco, ainda maior, porque o policial tem que ter a atenção naquele sujeito que pode ser alvo de uma bala perdida.

Soldados Leal e krug também concordaram com a dificuldade em muitas ações que a polícia precisa ser ágil. A dificuldade da ambulância chegar até os feridos, o palpite do que o PM tem que fazer, muitas vezes querendo orientar como se a prioridade em alguns casos não fosse salvar vidas, pois todas as medidas que devem ser tomadas serão, mas em alguns casos há um prioridades e a vida da vítima, seja em qualquer circunstância, sempre será uma delas.

Sargento Robson dos Bombeiros, disse que nas ocorrências tanto veiculares quanto incêndios, ele percebe que as pessoas tentam ajudar, mas precisam levar em consideração a área de risco. Porque muitas vezes acabam se expondo ao risco.” É importante que o momento em que aconteça o acidente o popular que presenciou, dentro do possível, nos comunique quantas pessoas e a gravidade, até para que possamos acionar os demais órgãos. Mas a partir da chegada da guarnição, precisa ter cuidado para não se colocar em risco. Um exemplo é quando usamos o desencarcerador, há o receio do rompimento de mangueira ou qualquer outro imprevisto” – comentou.

Mas de onde é que vem esse fascínio por ver pessoas feridas, mortas, carros destruídos, casas incendiadas e por que é que  muitas pessoas não conseguem desgrudar os olhos dessas imagens, mesmo quando as mentes ficam perplexas e os estômagos começam a revirar. Afinal, as sensações que experimentam não são nada prazerosas e, muitas vezes, há uma culpa por ter presenciado a cena e/ou ter filmado, fotografado.

A reportagem também conversou com a psicóloga Thais Severo para tentar compreender esse comportamento. Acompanhe.

 “Grande parte dos seres humanos apresenta uma curiosidade muito grande quando se depara com tragédias, sejam elas de causas naturais como furacões, tremores, deslizamento de terra, bem como quando se trata de acidentes de carro, incêndios e outros. O fato é que sempre que uma tragédia acontece, inúmeras pessoas se reúnem rapidamente ao redor do acontecido, e fotos começam a se reproduzir rapidamente, e todos ali querem saber, quem morreu? Por que morreu? Como morreu? Eram quantos? Como aconteceu? Muitos até mesmo fazem questão de quererem ver de perto corpos, destroços. 

E então, a população se divide em um grupo que acha um absurdo essas pessoas no local que por conta de sua curiosidade acabam atrapalhando o acesso dos serviços que precisam estar nesses locais para trabalhar, como ambulâncias, polícia, bombeiros. 

Já o outro grupo curioso que está lá ou nas redes sociais tentando esmiuçar o ocorrido. 

Parando para pensar e analisar o motivo de toda essa curiosidade, podemos analisar alguns pontos que levam a esse comportamento: um é o fator do proibido, não podemos, não devemos e nunca tivemos oportunidade de nos depararmos com algo trágico tão de perto, logo isso acaba fascinando. 

Segundo, a morte que é e sempre será um tema obscuro, que traz inúmeras dúvidas, além das dúvidas básicas de como ocorreu? Poderia ser evitado? Como seria a vida dessa pessoa? Ficam sobreviventes? Como será o futuro dessa família? 

Enfim, além dessas, vêm as dúvidas inconscientes de cada indivíduo de como é a morte, de como tudo acaba, e será que acaba? 

E um terceiro motivo que a olho nu nos parece cruel, mas analisando psicologicamente é a questão da vida real X a vida idealizada. Vemos o mundo do outro de uma forma idealizada, vimos postagens de viagens, momentos felizes, declarações de amor, onde acreditamos que o outro viva de fato somente nesse “mar de rosas”, pois nada que não seja bonito ou bom é postado. 

Então, quando nos deparamos com o feio, o sombrio, o mórbido, vimos um mundo real e não idealizado. Esses fatos trazem para perto de si o que se aproxima do que todo ser humano acha real. Traz a todos de forma inconsciente que aquelas pessoas sim, são reais, são como eles “normais” sem filtros, e embora sejam situações tristes, para o ser humano de forma inconsciente traz um certo alívio de que todos somos iguais, nem mais, nem menos, nem melhor, nem pior. E que no final das contas todos estamos suscetíveis a tragédias e dessa forma se conforta por não ser ele na situação tragicamente posta”. 

Thaís Campos Da Cunha Severo