Sindicatos de servidores resistem a eventuais processos de privatização estudadas pelo Estado

Para o funcionalismo, a solução da crise das finanças gaúchas passa pelo corte das isenções de impostos, concedidas como forma de atrair empresas

privatização

Virá dos sindicatos a maior resistência às privatizações estudadas pelo governo José Ivo Sartori. Representantes de categorias dizem ser, por princípio, contra a diminuição do Estado. Também afirmam que o repasse de serviços à iniciativa privada pode resultar em tarifas mais elevadas ao consumidor.

Para o funcionalismo, a solução da crise das finanças gaúchas passa pelo corte das isenções de impostos, concedidas como forma de atrair empresas. A relação entre as entidades e o Piratini já está desgastada em razão da ameaça de parcelamento dos salários, situação que se agrava mês a mês, e da ausência de previsão de reajustes — a Lei de Diretrizes Orçamentárias, aprovada na terça-feira passada pela Assembleia, não prevê aumento nos valores pagos aos funcionários.

Presidente da Federação Sindical dos Servidores Públicos no Rio Grande do Sul (Fessergs), Sérgio Arnoud diz que o déficit de R$ 5,4 bilhões previsto nas contas em 2015 poderia ser coberto com o corte de pouco menos de 50% dos benefícios, que somaram R$ 13,1 bilhões em renúncia fiscal em 2013. O problema é que, do montante total, o Estado tem gerência sobre R$ 7,3 bilhões, originários de incentivos atribuídos a empreendimentos que se instalaram no Rio Grande do Sul por meio de programas como Fundopem e Fomentar. A outra parte do valor — R$ 5,88 bilhões — se refere a renúncias que fogem à competência do Palácio Piratini, como as exportações e os produtos da cesta básica.

— Por princípio, somos contra a privatização. Somos contra o encolhimento do Estado, que é um prestador de serviço, e não um demandador. E justamente em momento de crise, falar em privatização é entregar o patrimônio público por preços aviltantes — critica Arnoud.

Presidente do Sindicato dos Técnicos-Científicos do Rio Grande do Sul (Sintergs), Joanes Machado da Rosa indica que o governo Sartori poderia buscar outras fontes para se capitalizar. Cita a venda de imóveis subutilizados do Estado e os créditos da Lei Kandir não pagos pela União, além da revisão das isenções fiscais.

— Existe a questão da dívida pública do Rio Grande do Sul com a União. É um débito que já foi pago, o governo poderia ingressar com ação judicial para deixar de quitar esse compromisso. — sugere o presidente do Sintergs.

Joanes se declara contrário às privatizações e admite que seriam aceitáveis, mediante “muito debate”, somente em casos extremos, de empresas que não prestam mais os serviços públicos de sua responsabilidade.

— Se a Corag realmente cobra mais caro do Estado do que as gráficas de mercado para imprimir o Diário Oficial, bem, daí ou se toma uma providência ou privatiza. Mas a Fepps, estratégica para a área da saúde, não pode nem ser cogitada. A sua privatização seria um crime de lesa-pátria — avalia Joanes.

Opinião mais ponderada vem do vice-presidente administrativo da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), Gilberto Schäfer, defensor de “amplos debates voltados ao interesse público”.

— Não podemos partir do pressuposto de que as companhias não podem ser privatizadas ou que devemos fazer a defesa do Estado mínimo. No caso da Corsan, é uma empresa pública sem preocupação com lucros. Seria interessante repassar à iniciativa privada? Temos de pensar estrategicamente, não apenas nos livrarmos para fazer caixa — diz Schäfer.

Passo a passo para privatizar

Dois os pontos tornam as privatizações um processo árduo: além das barreiras de mercado, impõem-se as longas e complexas etapas das negociações, reguladas por legislações estaduais e federais. Para Pedro Henrique Poli de Figueiredo, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado e membro do comitê de acompanhamento da liquidação de estatais do governo Britto, o tempo das negociações deve ser respeitado, sob risco de serem assinados contratos frágeis que poderão resultar em prejuízos:

— Com pressa, dá para fazer em dois anos.

O fator tempo é uma barreira ao governo Sartori. Como deve começar os procedimentos só em 2016, é possível que finalize as operações, e faça ingressar algum dinheiro em caixa, apenas em 2018, último ano do seu governo.

1 – Estimativa de impacto orçamentário e financeiro decorrente da privatização para o ano corrente e os dois subsequentes, conforme determinação da Lei de Responsabilidade Fiscal. Na prática, é um estudo para verificar quanto o Estado deixará de gastar e de arrecadar com a negociação concretizada.

2 – Realização de plebiscito, em que a população votará “sim” ou “não” sobre a venda de estatais. Em ano de eleição, caso de 2016, as consultas deverão ser realizadas junto com o pleito, em outubro. Nos outros anos, em 15 de novembro. Banrisul, CEEE, Corsan, CRM, Sulgás, Cesa e Procergs precisam passar por plebiscito antes da privatização. O decreto convocando a realização da consulta precisa ser publicado pelo menos cinco meses antes da data da votação.

3 – Apreciação de projeto de lei na Assembleia Legislativa, em caráter autorizativo, para dar continuidade ao processo de privatização. É necessário maioria simples de votos para obter a aprovação do parlamento.

4 – Avaliação de mercado do valor das ações ou empresas que serão negociadas. Essa etapa é conhecida como “project finance”, onde são verificadas todas receitas, despesas, mercados potenciais e eventuais passivos da estatal colocada à venda. Não é obrigatório contratar uma consultoria para efetuar esses estudos, mas o mercado, asseguram profissionais do setor, costuma exigir a apresentação de relatórios feitos por instituições e bancos com credibilidade para ter segurança no investimento. Também é preciso elaborar a justificativa da alienação do patrimônio a partir da lógica do interesse público.

5 – Lançamento do edital de licitação, com abertura de prazo para a apresentação de propostas de compra. Em caso de alienação, diz Pedro Henrique Poli de Figueiredo, é “recomendável” que se faça uma audiência pública para discutir a negociação.

 

Fonte: Zero Hora