Três frigoríficos suspeitos de comercializar carne sem condições de consumo são interditados no RS

Estabelecimentos de Parobé e Taquara são suspeitos de abater gado roubado e ainda de terem beneficiado a carne de animais que já chegavam mortos aos locais.

Uma operação da Delegacia de Combate ao Abigeato e Crimes Rurais interditou três frigoríficos nas cidades de Parobé e Taquara, na Região Metropolitana de Porto Alegre, por suspeita de comercializar carne sem condições de consumo.

Os estabelecimentos também são suspeitos de abater gado roubado e ainda de terem beneficiado a carne de animais que já chegavam mortos aos locais.

Quinze mandados de busca e apreensão foram cumpridos. Entre os alvos, estavam mercados e estabelecimentos comerciais que compravam a carne.

Escutas telefônicas

Em Parobé, fiscais agropecuários apreenderam carne congelada que teria sido vendida a um restaurante pela mulher considerada chefe do esquema, Nilva Garcia Lucas.

Em uma escuta telefônica realizada com autorização judicial, ela conversa com o dono do restaurante, José Henrique Oliveira, que encomenda “guisado de gado morto”. No celular dele, apreendido pela polícia, seu número foi salvo como a “Tia do guisado”.

Fornecedora: “Eu fiquei de dar uma ligadinha pro senhor sobre a carne moída.”

Cliente: “Ah, sim, sim.”

Fornecedora: “Aquela dos bois morto.”

Cliente: “Sim, dos bicho morto. Exato. Não, nem falei com a patroa, mas se quiser trazer um pouco ali, traz.”

A mulher, que também é investigada por adquirir gado roubado, encaminhava as reses (animais abatidos) aos frigoríficos interditados, que eram contratados para prestar o serviço. Depois, realizava a distribuição.

“Isso inclusive com absoluto conhecimento de quem está comprando essa carne, colocando em padarias, fazendo salgadinhos para vender, colocando em açougues e até mesmo utilizando outros estabelecimentos, outros frigoríficos pra processar essa carne”, diz o delegado André Mendes.

As gravações obtidas pela reportagem da RBS TV deixam claro que a carne era de má qualidade. Uma cliente chega a reclamar do excesso de sangue.

Fornecedora: “Tu precisa de alguma coisa pra amanhã? A carne moída e de strogonoff…”

Cliente: “Ah, não, meu amor. Não deu certo, tá? Não vai fechar negócio.”

Fornecedora: “Não deu?”

Cliente: “Não aprovei… não deu. Ela tem um cheiro de sangue, não ficou legal no strogonoff.”

A suspeita da polícia é que as cabeças de gado morriam no caminhão boiadeiro a caminho até o frigorífico. Ou até mesmo por doenças. Em um áudio, um homem comunica para Nilva que há duas reses mortas sendo transportadas entre Carazinho e Taquara. Ele diz que os animais estão muito inchados.

Homem: “Eu tô apavorado. Os caras tão lá em Carazinho. Tão empenhado lá. Morreu dois bois no caminhão já lá, cara.”

Fornecedora: “Meu Deus do céu.”

Homem: “Aproveita eles, não?”

Fornecedora: “Depende do jeito que tá.”

Homem: “Ah, tão inchado já, Nilda. Tão inchado, o alemãozinho disse.”

Contrapontos

Nilva, que está sendo procurada pela polícia, não foi encontrada pela reportagem. Em buscas na casa dela, policiais apreenderam uma arma.

Arma foi apreendida na casa de mulher investigada pela polícia — Foto: Polícia Civil/Divulgação

Arma foi apreendida na casa de mulher investigada pela polícia — Foto: Polícia Civil/Divulgação

José Henrique admitiu que comprava a carne de Nilva sem nota fiscal, mas negou saber que o guisado era oriundo de animais que chegavam mortos ao frigorífico. Ele disse que não lembra de ter usado a expressão “guisado de bicho morto”.

Questão de saúde

O médico infectologista da Ulbra Cláudio Marcel Stadnik diz que há sérios riscos à saúde dos consumidores.

“Assim como a carne é rica em proteínas e muito bom alimento para nós seres humanos, também é muito bom alimento para as bactérias, os vírus e os protozoários. Então, imediatamente a partir do abate, a partir da morte, começa o processo de apodrecimento”, afirma o especialista.

O médico diz que a carne beneficiada horas após a morte do animal, como é a suspeita investigada pela polícia, pode causar desde infecções intestinais e até mesmo problemas cerebrais.

Uma das suspeitas das autoridades é que as vezes morriam durante o transporte nos caminhões boiadeiros.

Restaurante em Parobé é suspeito de comprar carne de animais que chegavam mortos no frigorífero — Foto: Giovani Grizotti/RBS TV

Restaurante em Parobé é suspeito de comprar carne de animais que chegavam mortos no frigorífero — Foto: Giovani Grizotti/RBS Tv

Fonte: G1