ALL pede reintegração de posse de áreas nas margens da ferrovia

Em Santa Maria, 207 processos tramitam na Justiça Federal

all

A América Latina Logística (ALL) está movendo ações de reintegração de posse contra moradores das margens da ferrovia em todo país. Duzentos e sete processos tramitam na Justiça Federal em Santa Maria. Somadas a Região Central e a Centro-Oeste, são mais de 400. A ação mais recente ajuizada na Justiça Federal de Santa Maria foi há menos de dois meses.

A estimativa é que o número de processos até agora represente menos de 30% do total de ações que ainda devem ser ajuizadas, segundo o juiz Jorge Luiz Ledur Brito, da 2ª Vara Federal. Isso porque, a cada semana, entram novos casos.
Os moradores estão apreensivos em relação ao futuro e a Justiça verifica se existe a possibilidade de uma conciliação com os órgãos federais envolvidos.

_ Sabemos que, por lei, a área é do governo e tem de ser desocupada. Mas existe uma questão social por trás disso. Muitas famílias vivem em situação de vulnerabilidade. Quem sabe a desocupação possa ser feita por trechos e se consiga um local para realocar essas pessoas _ pondera o juiz, pensando em uma possível ação conjunta com a prefeitura.
Enquanto isso, funcionários da Gersepa, empresa de Curitiba contratada pela ALL para o serviço de segurança da ferrovia, têm percorrido a linha férrea fazendo levantamento dos moradores lindeiros.

A reportagem foi a cinco pontos da área urbana da cidade onde os trilhos são circundados por moradias: entorno da gare e da Rua Silva Jardim, no bairro Centro, bairro Campestre do Menino Deus, Itararé e Km3. Muitas pessoas estão temerosas diante da incerteza do futuro e se perguntam se terão de deixar as residências ou reduzir parte dos terrenos e casas. Os moradores não sabem se serão realocados em outras áreas, se têm ou não direito à indenização e, principalmente, por que, depois de tantos anos vizinhando com os trens, agora terão de sair.

Moradores da Rua Lupcínio Rodrigues, no Campestre, foram notificados em abril deste ano. O ferroviário aposentado Paulo Vecchio Diefenthaler, 55 anos, diz que, conforme a escritura, a linha férrea é que cruza dentro do terreno que comprou há cerca de 10 anos e onde mora com a mulher e a filha.

_ O que o juiz decretar, vou ter de fazer _ lamenta.

A ALL não informa quantas famílias, no total, serão atingidas, o que a empresa pretende em relação a esses moradores nem o trecho exato onde foram pedidas as reintegrações (veja a nota da empresa abaixo).

O que diz a ALL:

“A concessionária informa que ajuizou ação de reintegração de posse em razão de sua obrigação legal e contratual de preservação da faixa de domínio. A empresa deve impedir ocupações irregulares para garantir a segurança da operação e, principalmente, das pessoas instaladas em área de risco devido à proximidade com a linha férrea. Em Santa Maria, há ações ajuizadas para todas as invasões existentes na faixa de domínio da ferrovia. Os processos referidos seguem em trâmite na justiça.”

Entenda o caso

Quem está na rota das ações de reintegração de posse?

– Famílias que moram em áreas nas margens da linha férrea, na chamada faixa de domínio do governo federal. Uma escola de samba e uma escola municipal, no centro de Santa Maria, também estão entre as notificadas

Por que a ALL está movendo as ações?

– A área é da União, sob reponsabilidade do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). A América Latina Logística (ALL) tem a concessão para transporte ferroviário e contrato de arrendamento de bens com a antiga Rede Ferroviária, por isso, tem como dever manter livres estas áreas, além de fazer a manutenção da ferrovia. Há alguns anos, o Tribunal de Contas da União recebeu denúncia de ocupações das faixas de domínio (área lateral à linha férrea). O TCU questionou o Dnit que exigiu que a ALL cumprisse o contrato e tomasse providências para retomar as áreas

Qual a extensão da faixa de domínio?

– As áreas pertencentes à União (e que não poderiam ter sido ocupadas) variam de um trecho para outro. Na maioria dos pontos urbanos, onde os trilhos cortam os bairros, a distância considerada é de 15 metros para cada um dos lados a partir do eixo central da ferrovia, mas, em áreas rurais, pode chegar a 100 metros. Na Região Central, partindo de Santa Maria, os trechos sob a jurisdição da Justiça Federal do município, na direção de Porto Alegre, vão até Agudo. Em direção ao Norte do Estado, até Júlio de Castilhos. E, em direção à Fronteira-Oeste, até Mata

Qual a diferença entre reintegração e desapropriação?

– O caso da ferrovia envolve as duas coisas. As ações de desapropriação são movidas quando a área é particular e o governo quer utilizar parte ou toda ela. À época da construção da ferrovia, o governo desapropriou a área e indenizou os donos. Houve casos em que as pessoas não receberam os valores e ocorreu desapropriação indireta. Como se passaram mais de 10 anos, mesmo que, agora, os moradores contestem, o governo não pagará indenização porque o caso prescreveu. Já a ação de reintegração ocorre quando uma pessoa ocupa, indevidamente, uma área que não é dela. Neste caso, a ação assegura a posse do verdadeiro dono e não cabe indenização

O que deve acontecer com os moradores desses locais?

– A Justiça Federal está verificando a possibilidade de uma conciliação entre os órgãos federais envolvidos. Se o Dnit, o setor do Patrimônio da União e a ALL acenarem com a possibilidade de conciliação, a Justiça pode marcar audiências de conciliação para novembro. A Justiça também deve contatar o município para tentar realocar os moradores. Se não houver o interesse de conciliação dos órgãos federais, as pessoas terão de devolver parte do terreno ou deixar o imóvel, dependendo de cada caso

Fonte:DIÁRIO DE SANTA MARIA