O centenário sobrevivente de 22 irmãos, 15 dos quais morreram da mesma doença, é uma inspiração de longevidade

Ao chegar no endereço depois de um contato por telefone, a reportagem foi recebida pela filha, Cleonice. Com todos os cuidados previstos em razão do momento da pandemia, seguindo os protocolos, uso de álcool em gel e máscara. Logo na sequência, ela destacou que o centenário Heitor Antônio da Silva, estava ansioso, aguardando. Sentado em uma cadeira confortável, ele demonstrou muita simpatia, carisma e atenção. Um verdadeiro cavalheiro.

Ao completar 104 anos no último dia 21 de julho, pelos registros que o PAT buscou, leva-se a crer que o idoso seja o ancião mais velho do Município. Mas sua vitalidade, o deixa com uma aparência muito mais jovem. O centenário inicia, a entrevista, descrevendo que quando era jovem residia no interior com os pais e os irmãos. Há época, o estabelecimento rural ficava no 2° Distrito de Quarai. Devido a distância que a repórter mantinha dele, a filha era quem o auxiliava, em relação a audição que está um pouco comprometida.

Em sua narrativa sobre, sua longa trajetória, ele evidencia o quanto sempre foi apaixonado pela lide campeira. “Minha vida foi no campo e dele meus pais tiraram sustento para 22 filhos e assim, também, foi comigo, mas com um número bem menor de filhas, três.

Recordo que desde cedo todos(ele e os irmãos) ajudavam nas tarefas da casa e do campo. Enquanto uns iam buscar lenha, outros tiravam leite das vacas, assim como, tinham àqueles que faziam tarefas da casa. Muitas vezes minha mãe vinha pra cidade e nós tomávamos conta da casa. Era tudo escalonado, mas funcionava muito bem” – comenta.

Ele também comenta que sempre foi apaixonado por baile e adorava dançar, ainda acrescenta que era um ótimo pé de valsa, mas a maioria dos bailes aconteciam nas salas das residências dos vizinhos. “Nós passávamos pela manhã e já combinávamos que á noite iríamos levar uma ovelha carneada em troca, eles cediam a sala para que fosse feito o baile e, assim aconteceram muitos” – lembrou.

Entre os períodos mais delicados, ele aponta uma doença que não recorda bem, mas que infelizmente perdeu 15 dos 22 irmãos, restando sete e os pais. Foi um momento muito difícil. Neste momento, Heitor faz uma breve avaliação e compara aquele momento com o que estamos vivendo hoje, em que a população também está “refém” de um vírus ainda sem uma vacina e que está ceifando vidas. É preciso ter o entendimento de que as medidas de prevenção são importantes, isto que, na atualidade, a realidade ainda é muito diferente.

O pai e mãe de Heitor faleceram idosos, ele com 93 anos e a mãe com 85 anos. Todos os irmãos que sobreviveram aquele episódio fatídico também tiveram uma existência longeva, todos passaram dos seus 95 anos. Um dia depois que completou 101 anos, o centenário perdeu a esposa que estava com 85 anos, ela chamava-se Santa Margarida com quem teve três filhas, Rosa Ionice, Maria Cleonice e Berenice de Fátima.

A geração teve uma mudança muito grande entre a do Heitor que teve 21 irmãos, e a mais recente das filhas e netas e bisnetas. Ele teve três filhas, tem uma neta e agora uma bisneta.

Uma outra paixão é a terra, adora plantar horta entre flores que cuida no jardim. Cleonice disse que teve que “terminar”, com uma horta nos fundos da casa pois ele estava sempre lá e às vezes em dias muito frios, ela tentava fazer com que ele ficasse dentro de casa, mas sempre arrumava uma forma de sair e ela ficou com receio dele cair, apesar de ter muita força e coordenação motora.

“Ele faz tudo sozinho, come de tudo, é muito tranquilo. Mas não para nunca, não pode ver nada bagunçado ou uma sujeira, adora uma vassoura. Também não abre mão de um churrasco e de um chimarrão”, fala sorrindo Cleunice.

Que se emociona ao dizer que o maior orgulho sempre foi a honestidade do pai, por ser um homem muito correto que sempre honrou com todos os seus compromissos e nunca gostou de ficar devendo para alguém. A palavra empenha valia como fio do bigode. Um fio de bigode vale mais do que qualquer contrato escrito, palavra dada é palavra de honra, palavra de cavalheiro.

A maior herança que os pais podem deixar para os filhos não são as coisas materiais, passageiras e terrenas. O que realmente importa, e que ninguém pode tirar independentemente de crise econômica e enchentes, é a educação e a formação do ser humano. Todo o ensinamento, desde a educação primária até a superior, não pode ser roubada de ninguém. Isso, Heitor propaga com maestria.

 

Flaviane Antolini Favero