Rapidez das redes sociais pode levar a julgamentos imediatos e precipitados

O poder que a internet tem para a mobilização em tempo real também pode ser usado para dar vazão à histeria coletiva

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Estamos vivendo o tempo das mídias sociais. Espaços de construção social que têm como principal característica a autonomia – que se extrapolam ao controle de governos e empresas – nos quais pessoas de todas as idades e condições passaram a se manifestar, dar opiniões, reivindicar, criticar, interagir numa dinâmica singular. A tecnologia de comunicação na era digital amplia e reverbera as vozes numa rede que é local e global, genérica e personalizada, com o potencial de alcançar uma multiplicidade de receptores e uma diversidade de significados. Embora cada indivíduo construa seu próprio significado interpretando e processando as mensagens a que tem acesso, os ambientes culturais e sociais condicionam em grande parte essa construção simbólica.
O Brasil é citado pelo The New York Times como “a capital das mídias sociais”, destacando que o uso das redes sociais aqui tem chamado a atenção do mundo pela sua forte presença e adesão. As plataformas Twitter, Facebook e YouTube estão dentre as de maior utilização, e nesses casos só perdemos para os Estados Unidos. O Facebook, como acontece em boa parte dos países do mundo, é o mais acessado da categoria: segundo dados de outubro, tem 73,5% da audiência das redes sociais, totalizando 76 milhões de usuários no Brasil. Uma pesquisa do Ibope/YouPix mostrou que 92% dos jovens do país que acessam a internet usam redes sociais. Mesmo quando se leva em conta o total de pessoas que navegam na rede, de todas as idades, são 78% acessando algum tipo de rede social.
As pesquisas revelam não só o enorme sucesso dessas plataformas no país, como também a grande exposição à qual estamos sujeitos. No ambiente dinâmico das mídias sociais, qualquer pessoa possui o poder de produzir e compartilhar conteúdo com grande alcance em um curto espaço de tempo. O processo de interação promovido por esses canais permite que as pessoas se posicionem e expressem suas opiniões sobre as informações que chegam a elas em seus feeds de notícias, em tempo real.
É o espaço do “boca a boca” digital. É o espaço online 24 horas, sete dias por semana. Não há ocultamento. Tudo é visível, compartilhado, interdependente, viral. Na lógica das redes, em termos de gênese, tudo o que surge conecta dispositivos, dados, pessoas, organizações, movimentos sociais numa única teia de comunicação que envolve tudo e todos. Essa nova dinâmica favorece as articulações e o engajamento de usuários sobre determinados temas ou causas e, dessa forma, as informações geradas possuem grande potencial mobilizador. Um post pode favorecer a cooperação ou a solidariedade. Pode também denunciar uma irregularidade, um comportamento antiético. Pode engajar e mobilizar indivíduos em campanhas sociais, partidárias, movimentos sociais como Occupy Wall Street, Primavera Árabe, dentre outros.
Em 2013, o Brasil foi surpreendido pela enorme adesão às manifestações de junho. Isso se deu não apenas por descontentamento com a política e os governos do país, mas principalmente pelo fato de que as frustrações e indignações compartilhadas em redes sociais alcançaram um grande número de pessoas que se engajaram na causa e se mobilizaram indo às ruas, ainda que com bandeiras e objetivos diferentes. 
Potencialmente, as mídias sociais podem levar as pessoas a, individual ou coletivamente, agir como heróis ou vilões. A ter esperança ou medo. A se indignar ou apreciar. A condição para que o sentimento e a experiência individual se encandeiem e formem um movimento vai depender da rapidez e da interação do processo de comunicação.
Assistimos recentemente a dois episódios que mobilizaram a população brasileira: uma dona de casa que morreu espancada em Guarujá após a divulgação de um boato, em rede social, que a acusava de sequestro de crianças para utilizá-las em magia negra e uma torcedora do Grêmio acusada de racismo que perdeu emprego, teve a casa apedrejada e precisou sair da cidade. Não se trata aqui de uma comparação e nem de um juízo de valor. São citados apenas, como exemplo, para mostrar a força de mobilização das redes sociais. A reflexão aqui é sobre o processo de comunicação, sua propagação e as emoções a eles associadas.  Quanto mais rápido e interativo o processo de comunicação, maior a probabilidade de uma “comoção” coletiva. Não há separação entre real e virtual, entre verdadeiro ou falso, entre fato e versão, entre observação, imaginário, simulacro e representação.
Entender em que condições esses processos ocorrem e quais os seus impactos sociais nos levam a questionar o potencial e os riscos que uma imagem, uma mensagem, um post, um compartilhamento, um clique ou um acesso podem gerar. Nesse novo contexto, observamos o julgamento de atitudes e posicionamentos de indivíduos públicos ou anônimos, empresas, produtos, marcas, movimentos e causas que podem reforçar sua credibilidade, legitimidade e reputação ou destruí-las. Com a rápida disseminação de informação nas redes sociais, pessoas e organizações são julgadas primeiramente pela opinião pública e depois, quando for o caso, pela justiça. 
Em instantes, histórias e imagens – verídicas ou não – são contadas e compartilhadas por e para milhares de pessoas; opiniões são formadas, emoções são expressas. A retratação pública pode não ter o mesmo impacto e alcance que a informação espalhada nas redes sociais e, dependendo da forma que acontecer, pode gerar uma repercussão negativa ainda maior. E, quando ocorre uma condenação pela sociedade, as consequências podem ser irreversíveis.
A questão fundamental que se coloca é que esse novo espaço público, em rede, é um espaço de interação, mobilização, significação e ressignificação. Um espaço social em que as indagações sobre sua dinâmica, formação e implicações nos levam a questionar o destino que estamos forjando.
Fonte: Zero Hora