João, o hippie que resiste há mais de 30 anos no calçadão de Alegrete

Umas das figuras mais conhecidas do calçadão Hélio Ricciardi em Alegrete, João Candi Paz de Campos, é o entrevistado do Portal Alegrete Tudo.

Aos 60 anos, o alegretense trabalha com artesanatos, piercing e tatuagem no calçadão da cidade há 35 anos. João, como é carinhosamente chamado é atencioso, cumprimenta quase todos cidadãos que transitam pelo local. Às vezes, em meio a um atendimento ao cliente, o pessoal grita: João, ele responde um a um sem deixar faltar atenção à clientela que visita o “pano”, como ele mesmo faz questão de explicar onde expõe seus produtos.

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Com o 2º grau completo, no antigo Oswaldo Aranha, hoje Escola Cívico Militar, ele cursa magistério e está fazendo em EAD, a faculdade de Artes Visuais.

João carrega em seu currículo algumas Expointer e Exposição Feira de Alegrete, morou na Bahia por dois anos vendendo artesanato, ofício que começou a gostar aos 15 anos.

A comercialização do artesanato vem da época hippie, a qual se identifica muito com o movimento. João é casado e possui um casal de filhos, a Flora (20 anos ), e o Harijan (33 anos).

Foi com essa figura de bom papo que fizemos uma entrevista em pleno calçadão, num fim de sexta-feira, com intenso movimento de clientes. Confira:

Portal – Quais produtos e serviços tu ofereces no calçadão de Alegrete ?

Eu trabalho com produtos variados. Alguns compro para revender e outros eu mesmo faço. Também trabalho com colocação de piercing e tatuagem, serviço agendado.

Portal – Tua renda é dessa atividade ? Como é sobreviver da venda de produtos artesanais ?

Sim, eu sempre me mantive com a venda dos meus produtos. Tenho uma boa aceitação da população. Minhas despesas são os estudos e alimentação. Trabalho em feiras, eventos e no verão algumas praias.

Portal – Já sofreste algum tipo de preconceito nessa atividade ?

Sim. Num país capitalista que nem o nosso, ainda vai levar um tempo para isso acabar. As pessoas não mudam, muita rotulação, julgam pela aparência, cor e da situação financeira.

Portal – Durante esses anos todos, qual o caso ou cena atípica tu presenciou no calçadão da cidade ?

Um dia uma senhora idosa, aparentando aproximadamente 80 anos, parou no meu ‘pano’ para olhar os produtos e me falou: Eu vejo o senhor aí sentado no chão todos os dias e eu sempre tive vontade de ajudá-lo comprando alguma coisa do senhor, mas não encontro nada que eu use.
Daí ela deu uma olhada para um lado do meu pano e encontrou um esmurrugador ou dexavador com o símbolo de uma folha de maconha estampada em cima , achou bonito e comentou comigo.
Que bonito este potinho com está folhinha redondinha cheia de preguinhos, pra que serve ele?
Daí eu fiquei sem ação na hora (pois senti que não podia lhe comentar muito sobre o verdadeiro significado da peça que ela estava preste a adquirir. Tentei desdobrar, dizendo a ela que se tratava de um moedor, podia ser usado para moer alho, pimenta do reino, enfim tinha várias utilidades. Daí minha surpresa quando ela falou .
Ótimo, vou levar, estou precisando de um deste. E ela foi bem faceira com o dexavador para sua casa.
Passado alguns dias, apareceu um rapaz me perguntando se tinha sido eu que havia vendido o tal dexavador para sua vó, pois eles levaram um susto, achando que ela estava consumindo maconha.

Portal – Como é o comportamento no contexto geral do alegretense no calçadão ?

O pessoal é tranquilo, humilde e acolhedore. Eu particularmente tenho muito orgulho de ser alegretense. Me identifico com essa rotina, a gente conhece todo mundo e isso é bom.

Portal – A prefeitura já bateu o martelo, embora a obra nem tenha iniciado. O calçadão será reaberto para o trânsito de veículos. Como cidadão alegretense e assíduo frequentador do local, qual a tua posição sobre isso ?

Eu sou contra, aliás totalmente contra. Apesar de ter uma grande admiração e respeito pelo nosso prefeito e amigo Márcio Amaral, eu sou contra. Na verdade eu acho que vai ser um gasto desnecessário diante de outras reais necessidades. Já morei num prédio do calçadão e queria que fosse revitalizado e mais explorado para intervenções artísticas e shows e até exposições culturais. Calçadão é lugar de passear, conversar, tomar chimarrão e comprar uma pulseirinha do João.

Portal – Estamos numa pós pandemia, ano eleitoral, qual a tua mensagem para os alegretenses ?

Passamos por uma grande tragédia, perdemos muitos amigos e parentes. Todos sofreram direta ou indiretamente. Isso tudo vai servir para olharmos mais o nosso interior e ver o próximo de melhor maneira mais terna. Participei de um recital nesta semana e até recitei uma poesia que fala sobre o que passamos e estamos passando nos dias de hoje. O poeta alegretense Mário Quintana escreveu: E um dia os homens descobrirão que esses discos voadores estavam apenas estudando a vida dos insetos…

Tenho as melhores expectativas para um abençoado final de ano. Chegou a hora de rever os novos planos, reconsiderar os erros e retornarmos ao caminho certo. Alegria, saúde e felicidades para todos vocês.

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Carlos Macabro..

Gostaria do número telefone do João…Somos amigos mais de 20 anos só que o destino nos separou..Hoje moto em Fortaleza .CE..Queria ter esse privilégio de conversar com meu amigo.