“A vida quando dá uma segunda chance tem que fazer valer a pena”, diz sobrevivente de duas duras provações

A vida muitas vezes dá uma segunda chance, mas as pessoas precisam se agarrar com toda a força nessa tábua de salvação. Nem todos têm esse privilégio e, alguns são abençoados com a dádiva da vida por mais de uma ou duas vezes. Esse foi o caso do alegretense Guilherme Habi Grierson, hoje com 31 anos.

Ele passou por duas duras provações e conseguiu sobreviver. A primeira, há oito anos, em um acidente de moto ficou entre a vida e a morte e, mais recentemente devido à Covid-19. Guilherme que trabalha no ramo de gastronomia, tem uma empresa que fornece viandas e um aplicativo de transporte de passageiros. O trabalhador que conquistou o mercado com muito trabalho, considera ser uma pessoa abençoada.

 

 

Há 8 anos, no dia de uma das maiores tragédias do Rio Grande do Sul, 27 de janeiro, incêndio da boate Kiss em Santa Maria, ele também sofreu um grave acidente em Alegrete, mais sobreviveu.

O acidente

O alegretense conta que trafegava na rua Major João Cezimbra Jacques, quase em frente a antiga sede do Aconchego dos Caranchos. Um rapaz estava indo a cavalo no mesmo sentido, o homem era cuidador de cavalo e usava aquele trecho como parte dos exercícios  de doma. Quando Guilherme se aproximou, o homem atravessou a rua sem olhar, e ele não teve tempo de frear e acabou batendo em cheio no cavalo. Guilherme estava de moto, e foi arremessado alguns metros à frente. Na hora, perdeu a consciência por alguns minutos. Quando acordou, havia algumas pessoas que o auxiliaram e acionaram os amigos e familiares, naquela época, o alegretense residia no bairro Medianeira, cerca de 100m do local do acidente.

“Quando acordei tentei levantar e não consegui, senti uma dor forte no ombro, olhei minha perna, ela estava torta e eu não conseguia movimentar. Então esperei ajuda chegar, neste meio tempo, acredito ter apagado algumas vezes. Meus amigos acionaram os Bombeiros e fui levado à Santa Casa. Eu, com dores fortes só pedia que não tivesse sido nada grave. depois do raio x, o médico falou que havia fraturado o fêmur, a clavícula e teria que passar por cirurgia. Ali meu chão desabou, fiquei com muito medo. Fui para o quarto pois teria de aguardar para realizar o procedimento, fiquei uma semana no quarto aguardando. Neste período usavam pesos ( galões de água ) na ponta de uma corda amarrada na minha perna para poder manter esticada e não correr o risco de encurtar os tendões. Aguardei toda semana, pois teria que colocar um Haste no fêmur e demorou a chegar e, quando finalmente chegou, eu estava muito debilitado, fui para sala de cirurgia e o Dr Júlio Rigol que foi o responsável pela minha cirurgia, me examinou e explicou que não era uma cirurgia simples, mas devido ao meu quadro de saúde poderia ser arriscado fazer o procedimento. Então fui para UTI, segundo ele, lá teria atenção 100% e, assim, que estivesse melhor realizaríamos a cirurgia. ” descreveu Guilherme.

Na UTI, o alegretense teve que se recuperar de uma pneumonia, ficou uma semana, sem conseguir falar e muito fraco. Ele recorda que só pensava que não iria sobreviver, pois sentia-se fraco, mas graças a Deus diz que teve anjos que o cuidaram, além da atenção da equipe de saúde fora do comum.” Na UTI umas das pessoas que jamais vou esquecer é a Dra Nívia, que foi muito importante na minha recuperação. Quando sai da sala de cirurgia, uma falha na comunicação levou a informação até meu familiares que eu havia sido transferido para UTI em coma, o que fez minha família entrar em desespero. Dra Nívia conseguiu que minha mãe entrasse rapidinho para poder ver que eu estava bem, acordado lúcido, o que a tranquilizou de certa forma. Durante a cirurgia, um outro fato inusitado, ele sentiu todo o precedimento, mesmo sem dor tinha ideia do que estava acontecendo”- recorda.

Guilherme segue o relato citando que, na UTI, teve um ótimo atendimento e quando foi para o quarto, Dr Julio Rigol, outro profissional a quem é muito grato, pois sempre foi realista com ele. Depois de mais 20 dias de hospitalização ele teve alta, mas foram mais seis meses de fisioterapia, pois teve que reaprender a caminhar. “Além dos profissionais que fizeram parte da minha recuperação tenho duas pessoas que Jamais vou esquecer pela dedicação, a esposa Mariely Brasil, e meu amigo Anthoni Escarrone, que largaram tudo para me cuidarem tanto no hospital como depois. Eles correram atrás de tudo que eu precisava fazer, fisioterapia, remédios e consultas. Sem eles, realmente eu não sei como seria. Sou eternamente grato.  Fiquei com sequelas do acidente, ainda tenho a haste no fêmur com dois parafusos de fixação e a mobilidade reduzida. Mas Graças a Deus e todos que me ajudaram superei essa.”- encerrou a narrativa da primeira grande superação e o que já considerou como uma segunda chance de viver ao lado das pessoas que tanto ama.

Covid-19

Em 2021, oito anos depois, Guilherme novamente passou por um milagre.

Em razão da pandemia do novo coronavírus, o alegretense disse que foi colocado mais uma vez em teste. Após um ano do início da pandemia e um 2020 muito turbulento, a expectativa era uma renovação em 2021.

Mas o novo ano para Guilherme, começou turbulento. No local de trabalho, um incêndio no mês de dezembro, no espaço onde ficava a cozinha industrial deixou o local totalmente destruído. Mas, graças a ajuda de clientes, amigos e risotos beneficentes, ele conseguiu se reerguer do “baque”, reformar a cozinha e voltar a trabalhar. Passado dois meses do ocorrido, o grande susto e o mais tenso. Guilherme, assim como toda família, positivaram para Covid-19. Nos primeiros dias somente dor no corpo, e sintomas leves. O resultado positivo ao vírus foi em janeiro e foi direto ao gripário.

Na consulta, ele recebeu orientações, medicações e ficou em isolamento. Mas, cerca de seis dias depois, uma indisposição que o deixou preocupado, associada a dor forte no corpo e dor de cabeça. Preocupado, Guilherme retornou na UPA e realizou Raio X. Para a surpresa do alegretense, o quadro se repetia, ele estava com pneumonia. Foi medicado e liberado. Contudo, no dia seguinte a febre alta e a dor mais aguda o fez retornar à UPA. Os calafrios e a febre alta persistiam, o médico o orientou a fazer uso de mais dois medicamentos e o liberou para ficar em isolamento em casa.  No quarto dia, Guilherme passou a sentir dificuldades para respirar e mudou a estratégia, entrou em contato com a ESF Cidade Alta e lá, para sua surpresa, segundo ele, mais uma vez, o anjo de  branco, Dra Nívia, que ele já tinha uma grande gratidão o atendeu. “Oito anos se passaram e eu, em um momento delicado, fui atendido por ela. Expliquei o que estava sentindo nos últimos dias e ela, na mesma hora, me encaminhou para o hospital com requisição de baixa. Sai do posto direto ao Gripário. Infelizmente lá, não tive uma boa experiência, cheguei às 15 h e só fui para o quarto às 23h. O médico que estava de plantão solicitou uma tomografia, fiquei das 15h40 até às 21h esperando e, quando iria fazer a tomo, fiquei sabendo que não poderia pois meu peso ultrapassava o limite da máquina que é  120kg e meu peso é 124. Retornei para o gripário e fui atendido pelo Dr Sebastian, outro profissional que conheci e admiro muito, foi curto e rápido, pediu raio x e na mesma hora já solicitou leito, ou seja, em menos de 1 h ele resolveu toda situação e fui para o hospital de campanha”- descreveu.

Já no hospital de Campanha, o alegretense volta a ressaltar o profissionalismo e a dedicação de todos os profissionais. “Agradeço a Deus por ter colocado pessoas tão maravilhosas na minha vida, poderia ser injusto se nomeasse alguns, pois cada um ajudou de alguma maneira, com palavras e atitudes. Lá, o que eu mais senti falta foi minha filha Jhúlia de 4 anos que nunca dormimos uma noite longe, até eu positivar para a Covid, infelizmente não podemos levar telefone e realizamos um ligação por dia para família, mas minha filha, tinha medo de falar comigo no telefone no primeiro dia e isso me corroeu por dentro, não conseguia parar de chorar, pedi medicação para me acalmar e para poder dormir.  No segundo dia, a psicóloga conversou comigo, chorei por conta da minha filha e ela me perguntou se eu queria vê-la, pegou celular particular dela e ligou por chamada de vídeo e foi aí que conversamos e isso me fez muito bem e acredito que tenha sido o “medicamento que precisava para iniciar uma boa recuperação.
Admiro cada um que está na linha de frente e sou agradecido a todos que fizeram parte desta etapa também. Pois são pequenos gestos que mudam a vida de quem está lá dentro. É triste ver pessoas perdendo a vida, triste ver toda a dedicação dos profissionais para salvar vidas não ser suficientes diante desse vírus tão violento. Hoje, estou curado da  Covid, sou mais um sobrevivente, terei de passar por fisioterapia devido às sequelas, fiquei com pulmões muito fracos. Mas agradeço a Deus por mais uma vez me dar a oportunidade de viver para contar, e agradecer por ter anjos em minha vida, pois sem eles, eu não estaria aqui. Parabéns a toda equipe de saúde que está na linha de frente, Que Deus continue abençoando e protegendo a todos”. – finalizou.

 

Flaviane Antolini Favero