A frágil Lorena, que chegou pesar 700 gramas, deu lugar a uma brava lutadora pela vida

Eles chegam antes da hora, sem dar tempo para chá de bebê e decoração do quarto, muitas vezes. Os pais nem têm chance de abraçá-los antes de irem para a incubadora. Delicados, convivem com agulhas, tubos, sondas, alarmes, fios. Um dia estão bem, no outro, lutando pela sobrevivência. As mães destacam que ouvem muito as palavras, “um dia de cada vez”, mas isso muita vezes é angustiante. Tem o período do choro, da esperança e, principalmente, a fé. Do outro lado da redoma, pais com medo só querem a oportunidade de tê-los em seus braços. Quase sempre são assim as histórias de muitas famílias que passaram pela UTI Neonatal de Alegrete.

No último dia 31 de março, chegava ao mundo, Lorena Mendonça Benevides pesando 800g e 30cm. O dia mais esperado foi antecipado, Rafaela Mendonça estava com 27,6 semanas de gestação e a brava Lorena foi direto para Neo. Neste dia, Rafaela não pode abraçar, fotografar, amamentar e pouco viu a filha.

 

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“Eu, que sonhei com esse momento, nem sabia o que fazer. Tinha dado à luz a uma bebê prematura, que não estava respirando direito, e foi levada rapidamente dali para ser salva” – disse Rafaela que é casada com o músico Lucas Benevides.

A seguir, a reportagem vai descrever a experiência desses pais durante quatro meses, destes, mais de três na UTI Neonatal.

O início da entrevista com Rafaela, foi três dias depois que, mais uma vez, Lorena havia retornado para casa. Foram 94 dias na UTI Neo, quando ela deu alta pela primeira vez, porém, devido a alguns problemas que ainda são sequelas da prematuridade, ela retornou mais duas vezes para o hospital. Uma foi para a Neo e a segunda vez, para a pediatria. A terceira alta foi muito comemorada pelos pais.

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Rafaela disse que Lorena foi muito esperada e muito desejada, desde o começa da gestação ela tinha certeza que era uma menina. “Descobri a gravidez bem no início, com apenas seis semanas, tanto que fiz dois testes de farmácia que deram positivo e o de sangue deu negativo. Na dúvida, fiz uma ecografia e confirmei. Sai dali dizendo que estava grávida da Lorena. E tudo foi muito tranquilo. Logo a seguir, comecei o pré-natal e os exames que não tinham em Alegrete, fui a Uruguaiana ou Santa Maria para fazê-los, pois eu me preparei para realizar este sonho. O sonho de ter ela” – descreveu.

Por meses a rotina da mamãe foi super tranquila, sem dores, sem nenhum problema que pudesse representar que ela poderia ter um parto prematura. Rafaela trabalhava normalmente, até que começou a ter inchaços e descobriu que a pressão estava alta. Isso remeteu ao histórico de família, hipertensão, diabetes e pré eclampsia. Neste período, Rafaela já estava com 26 semanas de gestação. Ela foi ao médico e constatou a hipertensão e o primeiro atestado de repouso por 15 dias. Depois desse período, novamente ela voltou à rotina, pois estava tudo bem. Mas o monitoramento da pressão era feito pela médica ginecologista, Lívia Severo Perez.

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Como a médica estava viajando para os EUA, devido à pandemia, quando retornou cumpriu a quarentena e a consulta que era dia 18 ficou para dia 30 de março. Mas até então, o inchaço era o que mais incomodava a mamãe. No dia da consulta, o mundo da Rafaela deu um giro inesperado.

“Assim que entrei na porta do consultório, a médica disse que eu não estava bem e quando verificou minha pressão, o grande susto. Fui direto para o hospital.

O parto

“No outro dia, ela entrou no quarto e disse que teria que antecipar o parto porque eu quase não tinha líquido amniótico e pela hipertensão, nós duas estávamos correndo risco de vida. Naquele momento, eu me desesperei pois imaginei que seria para alguns dias e não horas de antecipação” – comentou.

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“Duas ginecologistas, a pediatra e a fisioterapeuta acompanharam o parto. Ginecologistas Lívia, Nívia a pediatra Marilene Campagnollo que também foi minha pediatra. Elas foram sensacionais, maravilhosas” – disse Rafa

O período na UTI Neo:

A jovem mamãe acrescenta que é outra pessoa. Pois cada dia é comemorado se o prematuro consegue um grama, tudo é muito intenso.

” Todos que estão ali passam pela mesma angustia, os pais choram, rezam, fazem promessas pois ali, todos percebem que a vida pode ser frágil, mas que esses pequeninos se agarram à ela com força extrema.Passam a dar valor as coisas simples como ter o filho nos braços, na hora e pelo tempo que quiser, do jeito que toda mãe sonha” completou.

Rafa lembra que eles passaram por muitas provações com a Lorena, mas para algumas mães, embora toda a atenção e dedicação da equipe, o ninho fica vazio. ” Passamos por momentos ruins, como o óbito de um outro prematuro. Embora teu filho esteja com algum ganho de peso, não tem como ficar feliz, pois a dor daquela mãe é sentida por todas”– citou.

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O período na UTI Neo também foi marcado pelas comemorações de cada mês e do primeiro quilo que Lorena atingiu. Rafaela disse que levar um bolo àqueles anjos que são incansáveis é apenas um pouco do que fez para demonstrar sua gratidão por todo carinho. Ela falou que também realizou muitas campanhas em prol da Neo e da pediatria. No total foram mais de cinco mil entre valores e doações, de uma tv para a pediatria, tapetes, entre outros. Tudo o que faz foi por perceber a doação daqueles profissionais e, cita a pediatra Dra Marilene Campagnollo, entre outros, além de toda equipe.

Quando Lorena chegou na UTI Neo perdeu peso e chegou a 700g. Ela foi muito forte e guerreira, Rafaela se emociona em dizer que teve muito medo de perdê-la. Além dos ciclos de antibióticos e a displasia broncopulmonar – doença resultante dos efeitos nocivos da oxigenação e ventilação sobre o pulmão imaturo. Isso, fez com que a pequena guerreira ainda necessitasse de muitos cuidados.

“O meu mundo é a Lorena. Não sei quando vou retomar o trabalho e ter dias mais leves sem as preocupações com ela, que ainda são constantes. Mas eu sou realizada por tê-la aqui.

São tantas horas, dias e meses dentro da Santa Casa que, além da equipe dos profissionais, os pais também convivem uns com os outros. São palavras, orações e ajuda. Um exemplo foi um casal de São Gabriel que ficou um mês na casa de Rafaela e Lucas. Eles não tinham onde ficar e foram acolhidos pelos alegretenses. Para Rafaela o desespero maior é se sentir impotente, como o caso em que foram mais de 30 minutos para conseguir pegar acesso no bracinho frágil de Lorena.

A experiência renova a fé nos mistérios da vida. Aquele ser frágil é, na verdade, forte. E milagres existem. A Lorena é um milagre.

Causas do parto prematuro

As causas de um parto prematuro são multifatoriais. Pode ocorrer devido a doenças prévias na mulher, como pressão alta e diabete, por enfermidades que surgem durante a gestação, como infecção urinária, e gravidez de gêmeos. A idade avançada da mãe também é um dos fatores, mas não determinante. Esses e outros quadros que variam de uma mulher para outra podem levar ao trabalho de parto prematuro e necessidade de uma cesárea precoce.

Para auxiliar nos gastos com a pequena Lorena, há uma rifa de uma ovelha disponível com os pais. Quem tiver interesse deve entrar em contato através das redes sociais Lucas Benevides e Rafaela Mendonça. O valor é de 5 reais o número.

Flaviane Antolini Favero