Boate Kiss: começou o mais longo julgamento do RS, prevê a Justiça

"Cirurgias várias, inúmeras. Fiz enxerto de pele, tirei pele das próprias pernas", relata

Começou na quarta‑feira (1º), no Foro Central I de Porto Alegre, o julgamento de quatro réus denunciados pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MP‑RS) à Justiça no caso do incêndio da boate Kiss, ocorrido em janeiro de 2013 em Santa Maria (RS).

A tragédia deixou 242 mortos e 636 feridos e resultou num processo de quase 20 mil páginas. Todos os acusados respondem por homicídio simples, com dolo eventual (quando o sujeito sabe que pode causar a morte e assume esse risco, indiferente ao que possa vir a ocorrer), e tentativa de homicídio.

Estima‑se que será o mais longo julgamento da história do Estado e um dos mais extensos ocorridos até hoje no Brasil, se estendendo por 15 dias. Para termos de comparação, o caso Bernardo levou cinco dias. Os de Suzane von Richtofen e dos Nardoni, seis dias cada.

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O juri é presidido pelo Juiz juiz Orlando Faccini Neto. O último depoimento que fechou a noite foi da terapeuta ocupacional, a alegretense de 28 anos, Kelen Giovana Leite Ferreira.

O Alegrete Tudo, em outras abordagens sobre o tema já entrevistou Kelen que teve 18% do corpo atingido pelo fogo. Por consequência do ocorrido, também teve a amputação de parte da direita e até os dias de hoje realiza tratamento.

Kelen Giovana Leite Ferreira foi a segunda sobrevivente ouvida no júri da Kiss.

Ela sobre as lesões que sofreu no incêndio. Emocionada, Kelen relatou que caiu na tentativa de fugir e que sua sandália ficou presa no tornozelo, cortando a circulação sanguínea.

“A última vez que eu corri foi para tentar me salvar da morte”, disse. A jovem relatou ao juiz Orlando Faccini Neto que passou pelo processo de aceitação desde o ano passado, em razão das cicatrizes.

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“Eu queimei 18% do corpo e eu perdi meu pé. Uso uma prótese em decorrência de tudo o que aconteceu”, destacou.

Kelen Giovana falou do processo de luto durante os quase nove anos após a tragédia. A sobrevivente criticou um documentário produzido pela defesa de um dos réus, em que ele fala sobre o processo.

“Dor não é gravar um vídeo e chorar. Dor é passar esses oito, quase nove anos, o que eu passei lá dentro, o que eu passo na minha pele, o que eu passo andando na prótese, machuca. Isso é dor. Dor é quando eu olhei muito tempo no espelho e chorei por ter ficado assim”, desabafou.

Kellen estava na festa com sete pessoas: duas amigas e cinco rapazes. Três faleceram: duas amigas de 18 anos e um dos homens, de 19 anos. Ela conta que, quatro dias depois, os médicos que passavam os boletins para o pai e a irmã perguntaram se tinham alguma religião.

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“Ele disse que éramos católicos, e ele disse ‘só Deus, porque a medicina já fez de tudo'”, relata Kellen.

A promotoria perguntou se ela tinha a mesma percepção de outros depoentes de que “a Kiss era um labirinto”. “Sim”, concordou Kellen.

Conforme o juiz Orlando Faccini Neto, ao menos três sobreviventes foram ouvidos neste primeiro dia de júri. Além de Kátia Giane e Kelen Giovana, deve acontecer a oitiva de Emanuel de Almeida Pastl, sobrevivente que se especializou em prevenção de incêndio e casou com enfermeira que cuidou dele.

Os empresários e sócios da casa noturna, Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann, o músico Marcelo de Jesus dos Santos e o produtor musical Luciano Bonilha Leão são acusados pelo Ministério Público (MP) pelos crimes de homicídio simples de 242 pessoas e tentativa de homicídio de outras 636 que sofreram ferimentos na tragédia.

O advogado responsável pela defesa do ex-sócio, Elissandro Spohr, 38 anos, é o também alegretense Jader Marques, que acredita que o julgamento será a oportunidade para que seu cliente dê a sua versão do que aconteceu.

Nesta quinta (2), o júri deve ouvir os sobreviventes Emanuel Almeida Pastl e Jéssica Montardo Rosado, pela manhã, e Lucas Cauduro Peranzoni, Érico Paulus Garcia e Gustavo Cauduro Cadore durante a tarde. Uma testemunha de acusação, Miguel Angelo Teixeira Pedroso, também será ouvida no turno da tarde.

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O primeiro dia:

Na parte da manhã foram sorteados os sete jurados que compõem o conselho de sentença. São seis homens e uma mulher. No total, 150 pessoas foram convocadas a comparecer no Foro Central. 85 solicitaram dispensa ao juiz Orlando Faccini Neto, que foram acatadas. Com isso, 65 participaram do sorteio.

A primeira a se manifestar foi a ex-funcionária da Kiss, que trabalhava no bar e na cozinha do local, Kátia Giane Pacheco Siqueira. A fala da sobrevivente durou, aproximadamente, 4h40, com perguntas do juíz, dos promotores e das defesas.

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