Vagner Souza, terapeuta psicanalítico, redescobriu a vida e todas suas possibilidades no Rio de Janeiro

Uma mensagem livre de rótulos, preconceitos e julgamentos. Ao registrar nas redes sociais a celebração do seu  casamento homoafetivo, o alegretense Vagner Souza, recebeu apenas apenas amor, sentimento simples e essencial para todos. Além de se surpreender com o alcance, pois para sua surpresa o post ganhou mais de quatro mil visualizações e  centenas de comentários. No último dia 24 de outubro Vagner oficializou sua união com o carioca Luiz Gaia. Na entrevista a seguir, o alegretense fala um pouco de sua trajetória em Alegrete, sua sexualidade, trabalho e os planos. Além de deixar lindas mensagens aos leitores.

A história do alegretense em sua cidade Natal.

Em Alegrete a história de Vagner Souza, tá muito ligada ao movimento de arte, cultura e teatro. Ele sempre foi muito atuante em teatro estudantil e ressalta que foi na escola, Polivalente, que começou a fazer teatro.” Eu lembro que o primeiro espetáculo que montei foi a pedido das professoras na Semana da Pátria. Criei uma peça com o nome de Espetáculo Brasil. Onde tinha a narrativa sobre as cores da Bandeira, que o verde representava as matas, o dourado, a riqueza, aquela coisa toda do ensino fundamental e foi muito legal” – lembra.

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Foi a partir dali que Vagner começou sua trajetória com teatro. Na sequência, ele estudou no Hecilda Alves Paim e no Emílio Zuñeda, onde tinha a companhia de teatro. Foi neste período que, em conjunto com os demais integrantes, venceu vários festivais de teatro estudantil. Isto com apresentações por vários Municípios do Estado.

“Aqueles saudosos festivais organizados pela Secretaria de Estado de Educação, eram maravilhosos. As finais eram em Porto Alegre, no Teatro Bruno Kiffer e na Casa de Cultura Mário Quintana” – comenta.

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Desta forma, o alegretense cita que ganhou muito conhecimento, experiência e “cresceu” dentro da arte. Aos 18 anos, Vagner resolveu mudar e foi residir em Porto Alegre. Nesta época era um dos jurados, no Teatro Nilton Filho, nos festivais de teatro estudantil e residia no local e não tinha custo algum, mas também não recebia nada, assim como, era responsável pela limpeza e organização do teatro. Vagner disse que esse período foi muito importante e enriquecedor.

” E, junto com a queridíssima, Elíria Malmam dos Santos, criaram o grupo Mensageiros, que hoje é o Coletivo Multicultural. Então, com vários jovens nós criamos esse grupo que é um movimento espírita. Montamos vários espetáculos, viajávamos muito nessa época e também eu era agente de cultura e lazer do SESC.”- destacou.

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Vagner ressalva que trabalhar no Sesc foi algo incrível, porque o Sesc é o maior programador de cultura do Brasil. Foi algo muito legal, muito incrível, o compromisso que a instituição tem com a sociedade, com os empresários.

Ele  participou da criação do FEACA  Festival Estudantil de Artes Cênicas de Alegrete, do Fac, Prêmio Comerciário do Ano. “A gente conseguiu fazer muita coisa por meio do SESC. Então, aí eu trabalhei no Sesc até 2006 quando me graduei. Eu iniciei uma faculdade de Pedagogia, que era pra terminar em quatro anos, eu terminei em sete. Lembro que os eventos do SESC consumiam muito tempo, a gente que liderava esses eventos. Era complicado conciliar  com a faculdade, mas consegui. Em 2006 eu me formei e aí vim pra Petrópolis, no Rio de Janeiro” – completa.

Ele lembra que foi interessante a ida para Petrópolis, porque  conversou com a mãe e comentou  a decisão que tinha tomado. E ouvi, o espanto à época, pois ela questionava se ele iria trabalhar no Sesc ou na Prefeitura e com essas negativas ficou apavorada pensando o que ele iria fazer no Rio, aos 29 anos.

Vagner lembra que naquele ano, o SESC Rio Grande do Sul estava sob intervenção por questões da direção da Fecomércio no Estado. Então, muitos dos investimentos na área da cultura, da educação, que era a sua principal atuação dentro da unidade, cessaram um pouco. Foi por esse motivo que ele foi se desapaixonando pelo processo, pelo trabalho que ficou muito limitado.

A mudança para o Rio de Janeiro

Porém, como sempre quis produção cultural, Vagner, arriscou-se na aventura de ir morar na cidade maravilhosa. “Quando eu cheguei no Rio de Janeiro, nossa, foi amor à primeira vista, gente, que cidade maravilhosa. Pra você ter uma ideia eu moro aqui há catorze anos,e  nunca fui assaltado, nunca vi uma cena de violência, que me envolvesse. Pode parecer mentira isso, né? É algo incrível. Não só pela história, o Rio de Janeiro foi capital Federal por muito tempo. Então, tem uma história, mas não apenas por isso, eu me sinto em casa. E como um bom espírita, será que eu não estou voltando pra casa de alguma forma?” – descreveu.

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Na sequência comenta que isso não seria um problema e ele foi conhecer a cidade Serrana de Petrópolis. E quando chegou na cidade histórica, sentiu- se em casa, lembra que foi tão interessante que nos primeiros movimentos de chegada em Petrópolis, foi aquela sensação de página em branco.

Sexualidade

Então, nesse movimento, dessa página em branco, ele passou a olhar pra vida e também pra questão da sexualidade.

Vagner comentou que já teve  relacionamentos  muito interessantes e profundos com mulheres, além de muito respeitosos e, isso, o auxiliou a ser o homem que é hoje. Porém, aos 29 anos olhou para trás e começou a perceber o que de fato tinha feito, o que contemplava aquilo que sentia, o que de fato, contemplava aquilo que o sensibilizava em relação não só a sexualidade, mas como a vida.

E aí ele percebeu que havia feito muita coisa, mas não havia feito pra ele. ” Eu sempre fiz, tudo para que as outras pessoas pudessem viver as suas experiências. A arte favorece muito isso, a gente quando cria um espetáculo, realmente é para as pessoas vislumbrarem, mas eu não queria o que a minha vida fosse um espetáculo de teatro. Eu não quero isso, eu queria que a minha vida fosse o que ela é hoje. Então, essa possibilidade de eu exercitar a minha vulnerabilidade, a minha exposição e as pessoas podem, tem todo o direito, de fazerem os seus julgamentos, de acreditarem, de terem as suas expectativas. Eu respeito e honro tudo isso, mas também tenho o meu espaço, de afirmação, de reafirmação” – completou.

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O casal

Então, em 2012 conheceu o, agora, marido. O Luiz é caracterizador de cinema que tem a função da criação do visual dos personagens: é o corte de cabelo, é o tipo de maquiagem, uma série de coisas. E ele fez grandes, grandes projetos, grandes filmes do cinema nacional e citou alguns como: Se eu fosse você dois, Polícia Federal, A Lei para todos. Além de séries pela Netflix como: O mecanismo, além de uma série nova que vai estrear daqui a pouco, também pela Netflix, que é Cidades Invisíveis.

No relato que faz do companheiro, Vagner o descreve como um cara supertalentoso. “Então, nesse momento,  eu volto pra essa minha identidade dentro da  sexualidade. Foi uma experiência muito, muito rica e engrandecedora” – comentou.

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Porém, o alegretense cita que no primeiro movimento, vem aquele susto, “Meu Deus do céu, meu pai militar, o que que vai achar? Minha mãe e meus irmãos. Mas aí, chega um momento em que ou você olha pra sua vida e faz algo grande com aquilo que você recebeu dos seus pais, não é? Ou você se fecha e vive uma vida medíocre e infeliz. Então, a forma de eu honrar os meus pais, porque foram eles que me deram a vida, era viver esse momento. Então, vivi e vivo esse momento. É incrível.”- completou.

O casamento

Ele e o esposo estão juntos há nove anos. E, neste ano saiu o casamento e foi muito interessante a decisão de transmitir através do facebook pois, segundo ele, foi de uma forma bem despretensiosa. Eles convidaram apenas uns amigos que realizam curso com ele, de todo o Brasil,  pois ele faz parte da Escola Vida, que é uma escola de desenvolvimento humano e crescimento espiritual professor Hilário Trigo, que tem sede em Curitiba, mas a gente tem as aulas online.

A transmissão tinha como objetivo convidar essas pessoas para acompanharem esse momento. Vagner fez uma programação na página do Facebook, para rodar a gravação e deu tudo errado. Na hora, ele teve que fazer uma transmissão ao vivo através do seu perfil no face. E, pra sua surpresa, o que seria um pequeno registro do casamento teve mais de quatro mil visualizações e quase mil comentários e o mais interessante, nenhum comentário ofensivo. Todos comentários de apoio, desejando coisas boas ao casal.

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” E o que que isso significa? Significa que quando você vive a sua verdade isso não incomoda a verdade de outras pessoas. Então, é  isso que a gente chama de integridade. É não termos conflito algum com quem nós somos. Enquanto há conflito na gente, nós estamos brigando com Deus, o mundo e as pessoas. E e aí a gente tá casado agora, é muito legal esse o casamento, porque o casamento é um grande passo na vida de duas pessoas, independente do sexo, do gênero. Hoje  sou terapeuta psicanalista integrativo e também constelador familiar, original Hellinger, estudo na Hellinger Show da Alemanha, com sede no Brasil e, em São Paulo, faço uma pós-graduação em constelações familiares. Por esse motivo, quando a gente percebe que o casamento é você tomar o destino da outra pessoa, nesse movimento de você tomar e dissolver-se naquilo que você toma, cria-se uma unidade e um caminho. Não que as pessoas precisam ter a mesma visão, a mesma percepção das coisas, mas um direcionamento sim, porque aí o casal cresce”- explicou.

 

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Vagner segue comentando que as pessoas avançam os processos, ou seja, o namoro, o noivado e depois o casamento, todos esses esses ritos que parecem uma brincadeira, mas não são. “Muitas pessoas que não evoluíram dentro dos seus relacionamentos, por exemplo, de um noivado para um casamento, hoje experimentam, por exemplo, escassez financeira, ou experimentam processos de transtorno de ordem afetiva emocional. Porque não levam adiante as suas vidas, não assumem a responsabilidade. Então, uma pessoa que não quer avançar num relacionamento, na alma ela está se perguntando ou procurando algo melhor. Aí as coisas acabam não avançando”- ressaltou.

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O alegretense ainda evidenciou que nessa época que estamos vivendo, principalmente nesse momento atual, o movimento que ele e o marido realizaram também é um movimento político. Porque é um movimento, não de afirmação e reafirmação, é um movimento de um lugar, da possibilidade de um lugar.

“Então, o que é a vida ? É uma infinita possibilidade, então, esse é o lugar. E é muito importante nós, pelo menos eu, que continuo sendo um formador de opinião, dar voz a esses movimentos. E não é uma questão exibicionista. É apenas uma questão de existir. Nós existimos. E existimos assim de uma forma digna, como muitas pessoa. E, o mais interessante para que eu e o Luís estivéssemos no dia 24 outubro, às onze horas, no cartório em Petrópolis, assinando aquele registro civil de união civil, muitos homens e mulheres gays, perderam suas vidas no passado, para que a gente pudesse ter essa liberdade hoje, pra que a gente pudesse gozar disso na atualidade” – enfatizou.

Desta forma, o alegretense argumenta que não é só um casamento do Vagner e do Luiz, é a unidade de algo que vem sendo construído há muito tempo. E algo que vem sendo excluído pela sociedade há muito tempo, também. Por esse motivo as crises desse segmento, principalmente as que envolvem a sexualidade, sempre foram um tabu pra humanidade.

“Mas é o momento de darmos dignidade a todos que queiram viver a sua integridade, a sua verdade de uma forma que contribua com a vida. São homens, mulheres e profissionais de uma competência incrível. Como terapeuta, eu ajudo pessoas a fazerem suas vidas darem certo.  Então, pra isso e por isso, eu uso a metodologia das constelações familiares” – citou.

A ligação com Alegrete

No ano passado quando o casal passou o Natal com a família dele, no bairro Coahb Vera Cruz, onde residem a mãe, Elizabete, a irmã Ana Valéria, os outros irmãos, Ana Cristina, a Cristiane e o Velb, todos residem em Alegrete, ele ministrou um pequeno curso, uma pequena experiência sobre constelações familiares.

E, neste ano, novamente estarão em Alegrete e pretende realizar um grande encontro sobre as constelações, para que as pessoas consigam perceber qual a dimensão, o que essa ciência das relações, a ciência dos relacionamentos, criada e evidenciada pelo alemão Bert Hellinger, pode ajudar.

“Eu posso dizer que leva a vida das pessoas para um outro nível. O nível de inclusão, de autorreconhecimento, de honra, de trazer aquilo que é importante pra dentro. Pois, quando eu trouxe meus pais pra dentro de mim, algo se curou em mim e não é a cura dos meus pais físicos e sim a imagem que eu, Wagner tinha deles. A imagem que me dava medo. A partir da dissolvição dessa imagem, eu pude experimentar de forma mais livre a minha vida”- esclareceu.

Vagner conclui que os alegretense vão ter oportunidade de participar de um encontro bonito sobre constelações familiares pra fazer a vida dar certo. Nas esferas que correspondem a vida pessoal, saúde, relações, casamento e também no trabalho. Essa oportunidade será anunciada com antecedência, quando confirmada.

Flaviane Antolini Favero

Fotos: arquivo Vagner Souza